O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva está no centro de uma controvérsia prolongada relacionada à importação de arroz, que tem sido amplamente discutida nas últimas semanas. Conhecido como “Arroz Gate” ou “Arrozão”, em referência a escândalos passados como o Mensalão e o Petrolão, este caso tem provocado considerável repercussão. Este artigo apresenta uma análise cronológica detalhada da polêmica.
Tudo começou quando o governo decidiu importar arroz devido às enchentes no Rio Grande do Sul. Este estado, responsável por 70% da produção nacional de arroz, já havia colhido 80% de sua safra antes das inundações.
No entanto, tanto a Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz) quanto o Instituto Rio Grandense de Arroz se opuseram à medida, argumentando que a produção nacional era suficiente para suprir a demanda do país em 2024, tornando a importação desnecessária.
Apesar das objeções, o governo persistiu na importação, dando início à controvérsia sobre os rótulos dos pacotes. O arroz subsidiado seria comercializado com embalagens ostentando os logotipos do governo federal e do Ministério da Agricultura e Pecuária. O deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar do Agronegócio, criticou a medida como um abuso de poder político.
Os representantes dos agricultores gaúchos expressaram preocupação de que a decisão do governo pudesse desencorajar os produtores locais a plantar na próxima safra (2024/25), potencialmente gerando problemas futuros no abastecimento. Gedeão Pereira, presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), destacou que o foco do ministro parecia estar mais na importação de arroz do que em apoiar os produtores locais.
Apesar das críticas, o governo prosseguiu e autorizou a importação de até 1 milhão de toneladas de arroz, com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), vinculada ao Ministério da Agricultura, encarregada da operação.
O primeiro leilão para selecionar as empresas responsáveis pela compra e distribuição do arroz importado foi marcado para 21 de junho. Este tipo de negociação envolve a contratação de empresas para intermediar a importação dos produtos.
O partido Novo conseguiu uma liminar no TRF-4 para suspender a compra do grão, na tentativa de impedir o leilão, mas essa liminar foi posteriormente derrubada.
Após o anúncio da importação, a Conab cancelou a licitação devido a um aumento de até 30% nos preços dos produtos do Mercosul. Inicialmente planejada para adquirir 104 mil toneladas de arroz estrangeiro, uma nova licitação foi realizada em 6 de junho, com o objetivo de comprar 263 mil toneladas do cereal produzido no exterior.
A situação se complicou ainda mais quando ficou evidente que empresas sem histórico no mercado de cereais venceram o processo licitatório. Entre os vencedores estavam uma fábrica de polpas de frutas de São Paulo, uma loja de queijos de Macapá e uma locadora de veículos de Brasília. Especial atenção foi dada à loja de queijos, que, poucos dias antes do evento, havia aumentado seu capital social de R$ 80 mil para R$ 5 milhões no site da Receita Federal, levantando suspeitas adicionais.
Outro fator que levantou suspeitas foi o envolvimento da Bolsa de Mercadorias de Mato Grosso (BMT) e da Foco Corretora de Grãos, ambas criadas em maio de 2023 por Robson Luiz de Almeida França, que intermediaram a venda de 44% do arroz importado pela Conab. Entre 2019 e 2020, Robson França foi assessor do ex-deputado Neri Geller, atual secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura no governo Lula. Além disso, de acordo com mídia, é sócio do seu filho Marcello Geller.
Após denúncias de possíveis irregularidades e bastante críticas nas redes sociais, o leilão foi anulado pelo governo federal na terça-feira, dia 11. O presidente da Conab, Edegar Pretto, alegou que, como o leilão foi conduzido pelas Bolsas de Mercadorias, o segmento das empresas vencedoras só foi descoberto após a conclusão do processo.
O presidente da FPA celebrou a anulação do leilão, afirmando em sua conta no X que a ação do governo era política, já que não há risco de desabastecimento de arroz no país.
No mesmo dia do cancelamento, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, anunciou que o secretário Neri Geller, responsável pela organização da licitação, pediu demissão e foi aceito o pedido. Porém, até nisso teve problema, pois Geller desmentiu o Ministro. Em entrevista ao jornal O Globo, ele diz que “não pediu demissão”.
Ontem à noite, o jornalista Claudio Dantas trouxe uma nova denúncia envolvendo a locadora de veículos que venceu o leilão e a Conab, reacendendo o debate sobre o assunto.
“A reportagem apurou que, em dezembro, o presidente da Conab, Edegar Pretto, lançou outro edital para a compra de 12,7 mil toneladas de milho, um contrato de R$ 19,8 milhões. Adivinhem quem levou? A empresa ASR Locação de Veículos e Máquinas, uma das 4 suspeitas a vencer o leilão de arroz”
Apesar do cancelamento da licitação, a oposição não deixou o assunto passar. Deputados oposicionistas planejam abrir a “CPI do Arrozão” para investigar os leilões de compra de arroz importado. A iniciativa, liderada pelo deputado Luciano Zucco (PL-RS), já conta 130 assinaturas, de no mínimo 171.
Mesmo com toda a polêmica, o governo ainda pretende realizar um novo leilão, ainda sem data marcada, com a participação de órgãos como Controladoria-Geral da União (CGU) e Advocacia-Geral da União (AGU).
A polêmica envolvendo a importação de arroz no governo Lula trouxe à tona questões importantes sobre a transparência e eficiência dos processos de licitação.